AS DIFERENTES ACEÇÕES E FUNÇÕES DO ESTADO

 

Antes da análise das diferentes aceções do Estado, importa atender ao seu conceito.

O Estado é definido pelo professor Pedro Costa Gonçalves em sentido lato, como «um conceito que abrange toda a aparelhagem pública de governo da coletividade com as suas organizações, funções, missões e competências, instituído para servir a coletividade e os cidadãos». O Estado constitui uma realidade distinguível, na opinião do professor, da realidade de Sociedade Civil, uma vez que esta se reporta ao «conjunto de cidadãos titulares de direitos e sujeitos de liberdades, bem como as organizações instituídas pelos cidadãos num espaço de liberdade e autonomia e no desenvolvimento de direitos subjetivos».

Aceções do Estado

Desta forma, o Estado Administrativo corresponde a uma das aceções do Estado dado que se reporta à esfera pública, ao setor público e à sua organização. Assim sendo, «é a parte da máquina do Estado, identificada com a Administração Pública que se ocupa das missões ou tarefas públicas que constituem a função administrativa» como explica o professor Pedro Costa Gonçalves.

O professor Freitas do Amaral, explicita esta aceção administrativa, defendendo que se trata do Estado enquanto organização administrativa. Ou seja, como entidade administrativa, não soberana, e sem poderes constituintes (só secundariamente pode participar em certos termos da função legislativa (artigo 198º CRP)), que exerce um poder constituído, juridicamente subordinado à CRP e às leis. Concluindo, o Estado – Administração é uma pessoa coletiva autónoma, inconfundível com os seus governantes, com os seus funcionários, com outras entidades autónomas que integram a Administração, ou com os cidadãos que com eles se relacionam.

 Acrescenta o professor Pedro Costa Gonçalves, que desta aceção se excluem:

Por um lado, num plano subjetivo ou orgânico, as organizações e departamentos públicos que não integram a Administração Pública (tome-se o exemplo da Assembleia da República e o Tribunal de Contas).

Por outro lado, num plano objetivo, as funções e tarefas públicas que não se reconduzam ao exercício da função administrativa (como sendo a função política, legislativa e jurisdicional).

Contudo, existe a aceção do Estado enquanto entidade internacional e enquanto figura constitucional, que merecem distinção segundo o professor Freitas do Amaral:

Primeiramente, isto significa que o estamos perante um Estado soberano titular de direitos e obrigações na esfera internacional, não importando a sua constituição, regime político, nem sistema económico-social, no primeiro caso e um Estado como comunidade de cidadãos que nos termos do poder constituinte que a si própria se atribui, assume uma forma política para prosseguir os seus fins nacionais, na segunda terminologia.

Em segundo lugar, na primeira aceção o Estado é soberano, enquanto que na segunda pode não ser independente mas goza do poder constituinte exercendo a função legislativa.

 

 

Funções do Estado

Sabendo que o Estado, na sua aceção administrativa é a principal entidade de entre as que integram a administração, desempenhando fundamentalmente a sua função administrativa, vejamos que outras funções executa o Estado e qual a sua interligação.

O professor João Caupers, estabelece a seguinte relação entre as funções estaduais:

A função administrativa é instrumental da função política, simultaneamente está subordinada à função legislativa e é controlada pela função jurisdicional. Isto significa que a função administrativa se serve dos comandos definidos pela política na tomada de decisões. A subordinação da função administrativa à legislativa traduz-se na obrigatoriedade de respeito e exigência de subordinação à CRP e às restantes leis. Finalmente, o controle feito pela função jurisdicional materializa-se pela fiscalização da atividade administrativa pelos tribunais administrativos.

Segundo o professor José Carlos Vieira de Andrade, para melhor se entender a diferença entre a função administrativa e política, deve ter-se em conta os artigos 197º e 199º que preveem respetivamente as competências políticas e as administrativas do Governo (a par das legislativas que se encontram no artigo 198º). Quanto a atos característicos da função política pode enumerar-se a título de exemplo, a referenda ministerial dos atos do Presidente da República, a dissolução da Assembleia da República, a promulgação de diplomas.

Já a função administrativa distingue-se da legislativa por via de dois critérios: quanto ao titular e quanto à modalidade. Ao nível do primeiro critério, para a administrativa é o Governo, enquanto que para segunda é primordialmente o Parlamento. Ao nível do segundo critério, é a prática de atos individuais e concretos e a emissão de normas jurídicas gerais e abstratas respetivamente.

Por fim, a função jurisdicional caracteriza-se pela «procura dos «fundamentos», do «valor», do «justo»», reiterando o professor Castanheira Neves. Tendo como conteúdo e fim a resolução de uma «questão de direito», sendo exercida pelos tribunais.

O professor Marcello Caetano, com a «teoria integral das funções do Estado» pretende abranger todas as categorias de funções e de atos, a partir da distinção entre funções jurídicas e as não jurídicas.

Segundo ele, são funções jurídicas as de criação e execução do Direito, ou seja: a legislativa (criação do Direito estadual) e a executiva, tendo esta das modalidades: jurisdicional (caracterizada pela imparcialidade e passividade) e a administrativa (caracterizada pela parcialidade e pela iniciativa).

Por oposição, as não jurídicas, desdobram-se na função política (de conservação da sociedade política e definição e prossecução do interesse geral) e em função técnica (produção de bens e prestação de serviços.

O professor Marcelo Rebelo de Sousa acrescenta à classificação do professor Freitas do Amaral, duas subclassificações: a função constituinte e a de revisão constitucional. A primeira corresponde ao poder de modificar a constituição do Estado e a segunda corresponde a um mecanismo indispensável de garantia da Constituição.

Na constituição atual, de 1976 a função jurisdicional é expressa no art.205º/2: «Na administração da justiça incumbe aos tribunais assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados».

Por outro lado, do art.202º, induz-se da expressão «no exercício de funções administrativas» as funções políticas e legislativas.

A função política stricto sensu ou governativa, encontra-se na síntese das competências dos órgãos políticos de soberania e das regiões autónomas, por exemplo art.136º,137º,138º entre outros.

Concluindo, é necessário não esquecer que embora a teoria da separação dos poderes de Montesquieu, tenha por base a divisão inequívoca das funções por estruturas orgânicas distintas, ou seja, seja baseada na absoluta de separação de poderes, a verdade é que essa divisão de poderes na prática não é assim tão distinguível porque em certa medida, interligam-se.

 

Bibliografia consultada:

 

ü  GONÇALVES, Pedro Costa, «Manual de Direito Administrativo», Volume I

 

ü  AMARAL, Diogo Freitas, «Curso de Direito Administrativo», Volume I

 

ü  CAUPERS, João, «Introdução ao Direito Administrativo»

 

ü  ANDRADE, José Carlos de Vieira, «Lições de Direito Administrativo»

 

ü  CAETANO, Marcello, «Manual de Direito Administrativo»

 

ü  Apontamentos das aulas teóricas do Professor Vasco Pereira da Silva

 

ü  Apontamentos das aulas práticas com o professor Jorge Pação

 

Maria Pereira, nº 64636, Subturma 12, Turma B

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